A VERGONHA
ANUNCIADA
TEREZA CRUVINEL, no BRASIL/247
Em
mais de 30 anos de jornalismo político, registrei dias de glória democrática e dias
de vergonha política na cobertura do Congresso. O 5 de
outubro de 1988, em que a Constituição (hoje desfigurada) foi promulgada
e o 25 de abril de 1984, em que a emenda das diretas
foi rejeitada, por exemplo. Este 2 de agosto parece
destinado a ser um dia da vergonha. Será vergonhoso para o Brasil deputados cevados por
favores e prendas de Temer conseguindo impedir(como praticamente já consumado) que ele seja investigado por corrupção passiva, pois
eles sabem muito bem o que fazem. Sabem de
tudo o que aconteceu: do que Temer combinou com Joesley Batista, do contrato
benevolente assinado entre uma subsidiária energética da JBS e a
Petrobrás dias depois, da mala de dinheiro entregue ao preposto
Rocha Loures horas depois. Os que estão dispostos a honrar
seus mandatos votando a favor da abertura das investigações, em
sintonia com 93% da população (pesquisa Vox
Populi) são minoria e poderiam, no máximo, impedir que a votação
ocorresse hoje, negando presença no plenário para a formação do quórum de
342 deputados. ||| Para não ficar na
História coberto de vergonha, qualquer presidente honesto acusado de corrupção
faria questão de ser investigado. Mas Temer, o primeiro na história do
presidencialismo brasileiro a sofrer tal acusação no cargo, preferiu comprar
votos descaradamente para não ser investigado. Seguro de sua inocência, devia
preferir o processo conduzido pelo STF, ao final do qual seria inocentado e
retornaria glorioso ao cargo do qual foi afastado. ||| O rito da votação estabelecido pelo presidente da
Câmara, Rodrigo Maia, também foi vergonhoso. Falaram por 25 minutos o autor do
parecer vitorioso na Comissão de Constituição e Justiça, favorável ao
arquivamento da denúncia, Paulo Abi-Ackel, e o advogado de Temer. Depois
falaram, por 3 minutos cada, dois governistas e dois defensores da concessão da
licença para o processo. Ou seja, 56 MINUTOS para os defensores de Temer e SEIS MINUTOS para os adversários. É isso que os parlamentares costumam chamar de
rolo compressor, um eufemismo para ditadura da maioria. ||| A noite deve ter sido de transações tenebrosas, com o
governo dobrando as ofertas para convencer deputados “indecisos” a estarem
presentes na hora da votação, ainda que não votem, ou ainda que votem com a
oposição. Já não importava ontem dar uma demonstração de força, com a rejeição
da denúncia por cerca de 300 votos, num sinal para o mercado de que Temer terá
condições de seguir em frente, reaprumando seu combalido governo e retomando as
contrarreformas. Precisando de apenas 172 votos, para evitar que os defensores
da investigação consigam os 342 necessários, o governo já se contentava ontem
apenas com a barragem da denúncia por um número minguado de
votos. ||| Temer, que finge viver no mundo da
lua, ontem falou que o desafio do quórum é da oposição e projetou uma “segunda
fase” de seu mandato depois de ser vergonhosamente vitorioso hoje. Mas ele e
seu entorno sabem que vem por aí é uma segunda denúncia, que terão de enfrentar
com a munição esgotada. Os compromissos foram firmados apenas em relação a esta
primeira acusação, de corrupção passiva. Nem todos estarão dispostos a um
segundo desgaste, tendo pouco ou nada mais a ganhar. ||| E
há também outra razão para o desespero. Neste primeiro round, Rodrigo Maia
(DEM) optou pelo papel de aliado leal, fixando o rito favorável ao governo e
conduzindo a sessão com empenho explícito. Mas sobrevindo uma segunda denúncia,
o cavalo estará passando outra vez selado em sua frente, e ele poderá
decidir-se a montá-lo. E aí poderá oferecer aos deputados a preservação dos
cargos que já têm no governo, mais aqueles que serão desocupados com a saída da
turma de Temer (PMDB) do governo. Foi assim que Cunha e Temer conseguiram
desmontar a maioria de Dilma e aprovar o impeachment na Câmara, oferecendo-lhes
o que já tinham ganhado dela e mais o que ganhariam com o enxotamento dos petistas do governo. |||
Mas para isso, é claro, o procurador-geral Rodrigo Janot precisa
desmentir os boatos espalhados por governistas, de que ele tem razões para não
apresentar a segunda denúncia contra Temer.
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