O GRITO DOS FRANCISCANOS
NO BRASIL: NEM UM DIREITO
A MENOS
Franciscanos e franciscanas no 'Capítulo Nacional das Esteiras', em Aparecida(SP) |
Um encontro histórico dos
franciscanos e franciscanas de todo o
Brasil proclamou em carta aprovada por unanimidade nesse último domingo (6) a adesão incondicional ao papado de
Francisco e definiu como missão:
“participar da reconstrução da Igreja com o Papa Francisco
e reconstruir o Brasil em ruínas”. Trata-se de uma citação
de um dos momentos mais conhecidos e cruciais
da trajetória de São Francisco que, em 1205,
na abandonada igreja de São Damião, em
Assis, ao contemplar um crucifixo ouviu o que lhe parece uma
mensagem direta: “Não vês como está a minha Igreja? Está
em ruínas. Vai, e reconstrói a minha Igreja”.
O mantra do encontro, repetido por quase todos os palestrantes e
nas homilias durante as missas foi: voltar a Assis – retomar o espírito
original de São Francisco. ||| Um dos trechos da carta é todo vazado a
partir da melhor tradição da teologia latino-americana, severamente reprimida
durante os 35 anos da restauração conservadora sob João Paulo II e Bento XVI: “A realidade ecológica e sócio-político-econômica do nosso país nos exige
compromisso profético de denúncia e anúncio. Assistimos, tomados de ira
sagrada, à violação dos direitos conquistados, através de muitos esforços,
empenhos e articulação pelo povo brasileiro. Por isso, não podemos deixar de
nos empenhar junto aos movimentos sociais na luta ‘por nenhum direito a menos’,
contra golpes, reformas retrógadas e abusivas conduzidas por um governo
ilegítimo, um parlamento divorciado dos interesses da população e uma justiça
que tem se revelado fora dos parâmetros da equidade que no lugar de fortalecer
o papel do Estado para atender às necessidade e os direitos do mais
fragilizados, favorece os interesses do grande capital”. ||| Foram quatro dias marcados pela emoção e o compromisso, com
representantes dos mais de 20 mil religiosos da Primeira Ordem (Frades Menores,
Frades Menores Capuchinhos, Frades Menores Conventuais), da Segunda Ordem
(Irmãs Clarissas), da Ordem Franciscana Secular (leigos), da Juventude
Franciscana (leigos), da Terceira Ordem Regular (TOR), das Congregações e
Movimentos simpatizantes de Francisco e Clara de Assis presentes no Brasil -se
você quiser ler uma cobertura detalhada do encontro pode clica no site da Província
Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil (aqui). ||| O
encontro teve o título de Capítulo Nacional das Esteiras, símbolo da
simplicidade, pobreza e disponibilidade franciscana. O espírito de retomada
esteve patente, conforme assinalou a carta. ||| Franciscanos e
franciscanas conclamaram à construção de “um novo horizonte utópico” fundado
nas bases históricas do país “marcadas pelo sangue dos pobres e pequenos,
indígenas, mulheres e jovens negros, por um extrativismo desmedido e
destruidor, por uma economia que exclui a maioria, por destruição de povos, culturas
e da natureza.” ||| Um dos centros da reflexão do encontro
foi a Laudato si – sobre o cuidado da casa comum, encíclica de
Francisco sobre o planeta, que se abre exatamente com uma oração de São
Francisco: “LAUDATO SI, mi Signore – Louvado sejas, meu Senhor’, cantava São
Francisco de Assis. Neste gracioso cântico, recordava-nos que a nossa casa
comum se pode comparar ora a uma irmã, com quem partilhamos a existência, ora a
uma boa mãe, que nos acolhe nos seus braços: ‘Louvado sejas, meu Senhor, pela
nossa irmã, a mãe terra, que nos sustenta e governa e produz variados frutos
com flores coloridas e verduras’” –a íntegra da encíclica aqui.
CARTA DE APARECIDA >>>> “Ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos
pobres. ” LS,49 *** A Conferência da Família Franciscana do Brasil, celebrando o Capitulo
Nacional das Esteiras, consciente de sua missão de “levar ao mundo a
misericórdia de Deus”, dirige-se a todas as pessoas de boa vontade: àquelas que
continuam acreditando em um mundo de justiça e fraternidade e àquelas que, em
meio às contradições e crueldades de nosso tempo, vivem a dor da desilusão e da
falta de esperança. *** As partilhas realizadas nesses dias
nos levam a afirmar: vivemos um verdadeiro Pentecostes. Neste sentido, o
Capítulo nos chamou a um revigoramento do Carisma e nos levou a fazer memória
da herança, da inspiração originária que deu início ao movimento franciscano. A
experiência das esteiras nos leva a retomar nossa vocação enquanto peregrinos e
forasteiros. *** As bases nas quais foram construídas a
nossa história estão marcadas pelo sangue dos pobres e pequenos, indígenas,
mulheres e jovens negros, por um extrativismo desmedido e destruidor, por uma
economia que exclui a maioria, por destruição de povos, culturas e da natureza.
À luz do nosso carisma, compreendemos que se faz necessário construir um novo
horizonte utópico que nos comprometa com a construção de um projeto de país com
justiça e paz em respeito à integridade da criação. ***
Somos sensíveis ao grito dos empobrecidos e da Mãe Terra! É preciso
agir com misericórdia para com eles e, com indignação diante desse sistema que
exclui, empobrece e maltrata, e convocarmos a todos para se unirem à luta que
hoje assumimos juntos: participar da reconstrução da Igreja com o Papa
Francisco e reconstruir o Brasil em ruínas. *** É chegado o
momento de recolher nossas esteiras e as lançar sobre o chão das periferias do
mundo, transformando continuamente nossa maneira de ser, estar e consumir em
resposta aos apelos do Papa Francisco. *** A realidade
ecológica e sócio-política-econômica do nosso país nos exige compromisso
profético de denúncia e anúncio. Assistimos, tomados de ira sagrada, à violação
dos direitos conquistados, através de muitos esforços, empenhos e articulação
pelo povo brasileiro. Por isso, não podemos deixar de nos empenhar junto aos
movimentos sociais na luta “por nenhum direito a menos”, contra golpes,
reformas retrógradas e abusivas conduzidas por um governo ilegítimo, um parlamento divorciado dos interesses da população e uma justiça que tem
se revelado fora dos parâmetros da
equidade “que no lugar de
fortalecer o papel do Estado para atender às necessidade e os direitos do mais
fragilizados, favorece os interesses do grande capital”.
Cardeal. Paulo Evaristo Arns, sacerdote franciscano |
***
Desta cidade de Aparecida, Nossa Senhora, Padroeira do Brasil,
resgatada das águas de um rio, hoje poluído e degradado, nos faz eleger dentre
os diversos apelos um compromisso particular com a Irmã Água. Deste modo, nos
empenharemos na construção de um processo de reflexão e ação em defesa da água
como bem comum, que se dará através da participação da família em jornadas,
fóruns e nas iniciativas de fortalecimento dos trabalhos ligados à promoção da
Justiça e da Integridade da Criação. *** Tudo isso acontece,
irmãs e irmãos, porque São Francisco nos ensinou que nos momentos mais difíceis
de nossas vidas devemos voltar à Casa da Mãe. Ele e seus irmãos voltavam, com
frequência, à pequena igreja de Santa Maria dos Anjos, a Porciúncula. Nós
voltamos ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida, nestes 300 anos de caminhada
com os pequenos desta terra. *** “Ó Mãe preta, ó Mariama!
Claro que dirão, Mariama, que é política, que é subversão, que é comunismo. É
Evangelho de Cristo, Mariama!”, ainda assim, invocamos suas bênçãos sobre toda
a nossa família e sobre um Brasil sedento de “Paz – fruto da justiça, do bem e
da Misericórdia de Deus”. *** Conferência da Família Franciscana do Brasil – 6 de agosto de 2017.
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