sexta-feira, 25 de maio de 2018


As narrativas  em torno da ‘greve’ dos caminhoneiros
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ALEXANDRE DA MAIA, no VERMELHO

Vimos nos últimos dias uma alardeada paralisação de caminhoneiros no Brasil todo. Com a divulgação incessante do movimento pela grande imprensa, houve a cristalização da narrativa de greve dos motoristas responsáveis pelo transporte dessas cargas pelas rodovias brasileiras, o que teria gerado o déficit de abastecimento de mantimentos no comércio e falta de combustíveis para abastecimento de carros, motos e aviões. Mas o que começou como um movimento legítimo pode trazer outras leituras de compreensão dos fatos, com um sintoma de como podemos construir leituras da realidade brasileira.    |||  O que se pretende neste texto é apresentar as múltiplas formas de compreensão dessa situação apresentada pela grande mídia como caótica e, por conta da prevalência dessa forma de entender o problema em detrimento de outras variáveis, muitas vezes imprevisíveis, a narrativa termina por condicionar os corpos e as mentes, obscurecendo a discussão de outras possibilidades, sobretudo num contexto político, econômico, jurídico e social em que os horizontes de expectativas podem (eu disse “podem”) estar suscetíveis a rupturas em sua dinâmica interna.  |||  A alardeada falta dos produtos condicionou corpos e mentes de maneira a produzir uma incessante procura gerada pelo medo da falta, para além da própria escassez, mola-motriz da economia de mercado. A operação que constitui a escassez é entendida como “acesso a uma quantidade sob a condição de que tal acesso limite novos acessos. Com isso, o aceso produz escassez, enquanto que, por sua vez, a escassez funciona como motivação para o acesso”, como afirma Niklas Luhmann em A Economia da Sociedade. E o sistema econômico precisa da escassez para construir novas expectativas para mover sua dinâmica interna. No caso dos combustíveis, a narrativa foi além da escassez, pois rompeu a previsibilidade do acesso por conta da “greve”, o que gerou um frisson na luta por gasolina e álcool, provocando uma diminuição da oferta, a despeito de uma demanda cada vez mais intensa. 



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