Mirian, FHC e o DNA de uma farsa
O Conversa Afiada publica, com exclusividade, artigo de Palmério Dória, autor do clássico "Principe da Privataria":
MIRIAN DUTRA, FHC E
O DNA DE UMA FARSA
Palmério Dória(*)
No burburinho da Assembléia Nacional Constituinte dois fatos
chamavam a atenção: a proverbial resistência física do velho e inesquecível
Ulysses Guimarães, que comandava sessões que varavam a madrugada sem perder o
humor e sem sequer ir ao banheiro, e o tórrido romance vivido pelo senador
tucano Fernando Henrique Cardoso e a jornalista Mirian Dutra, estrela dos
noticiários da Rede Globo.
Mirian,
profissional dedicada e discreta, era uma mulher desimpedida. FHC, o
"príncipe dos sociólogos", ao contrário, era casado desde os anos 50
com a respeitada antropóloga Ruth Cardoso, com quem teve três filhos e um
casamento que se julgava sólido até então.
Nos
restaurantes e bares de Brasília um Fernando Henrique fora do eixo, com
surpreendente comportamento juvenil, trocava olhares lânguidos, roçava pernas e
pés, desfilava de mãos dadas e se afogava em beijos que faziam a alegria de
quem presenciava o inusitado de uma paixão arrebatadora. Uma dupla quase sempre
lhes fazia companhia, em situação semelhante: a linda deputada Rita Camata
(PMDB-ES), casada(com o senador Gerson Camata), e o poderoso Alberico Souza Cruz, diretor do
telejornalismo global e chefe de Mirian.
O resultado
desse amor que não podia ser assumido se materializou num teste de gravidez.
Positivo. Tomás Schmidt Dutra estava a caminho. Seria registrado pela avó num
cartório de Brasília, após seu nascimento, em 26 de setembro de 1991.
Tomás Schmidt Dutra(24 anos) |
Mirian
teve Tomás apoiada por amigos próximos. Não lhe faltou nada, exceto a presença
do pai, que meses antes a expulsou aos gritos de seu gabinete no Senado ao ser
comunicado da gravidez. O frio, sarcástico, irônico, cínico, racional FHC,
descontrolou-se como nunca, indicando-lhe a porta de saída aos berros de
"rameira", chutando um circulador de ar da sala de espera, sendo
contido por assessores, enquanto uma humilhada Mirian Dutra, chorando, era
acolhida nos braços de um passante. Para desgraça do agressor, tratava-se de um
dos jornalistas mais respeitados do país, Rubem Azevedo Lima, decano dos
profissionais de imprensa no Congresso Nacional com passagens pelo Correio da
Manhã, Folha de S. Paulo e Correio Braziliense, por exemplo.
Retirada
do cenário do barraco, Mirian seria procurada por Sérgio Motta, sócio de FHC, e
José Serra. A paz seria celebrada com promessas que lhe foram feitas e
cumpridas. Imediatamente ela mudou de casa. Foi para um apartamento maior e
melhor que o seu, na SQS 211, em Brasilia. Sua mudança foi feita pela equipe
que a acompanhava nas reportagens da Rede Globo: o motorista, o cinegrafista e
o iluminador, o popular "pau de luz", um tipo brincalhão que
protagonizou um episódio que ficou célebre no diz-que-diz das noites do
Piantella: ao desembarcar a cama de casal de um caminhão alugado para a
mudança, bateu as mãos no colchão e sentenciou, solene: "esse é o do
senador!".
Ao ir
para Lisboa, numa TV associada à Globo, a SIC, do ex-primeiro-ministro Pinto
Balsemão, Miriam Dutra tornou-se a última exilada brasileira. E, também, a
primeira beneficiária da maior bolsa família já paga com dinheiro público.
Logo após
sua partida, o cunhado e lobista Fernando Lemos, casado com a ex-trotskista
Margrit Schmidt Dutra (hoje uma militante furiosa da extrema-direita nas redes
sociais), iniciou um curioso e repulsivo processo de efetuar gorda coleta da
mesada para a cunhada e "o filho do presidente". Agnelo Pacheco, o
publicitário que abiscoitou a descomunal conta da Caixa Econômica Federal e
trocou sua imagem corporativa numa ação milionária combinada com o embaixador
Sérgio Amaral (negociata de milhões, centenas de milhões), puxou a fila dos
mecenas. Wagner Canhedo, o dono da VASP, marcou presença. A White Martins e o
Banco Icatu, idem. Nunca uma pensão alimentícia movimentou tanto o filé do
capitalismo tupiniquim. Era uma "bolsa pimpolho" operada por lobistas
e megaempresários. Era um escândalo. Tomás e Mirian, certamente, ficaram com a
menor fatia do butim.
Tratava-se
de um mensalão doméstico, igual ao que a Construtora Mendes Júnior e Renan
Calheiros teriam feito no caso de uma filha do senador alagoano com uma modelo
– e hoje o caso está nas altas instâncias judiciais dando dor de cabeça intensa
ao presidente do Senado. Mas, como sempre, FHC estava acima da lei.
De Lisboa
a família sem pai se muda para Barcelona. Lá vamos encontrá-la num bairro
elegante, em bom edifício, levando uma vida sem sobressaltos. Mirian estava
fora do vídeo, mas ainda na folha de pagamentos da família Marinho. O padrinho
de batismo de Tomás havia sido muito prestativo com o pai do menino e ajudou-a
muito. Era o conhecido e poderoso diretor de jornalismo global Alberico Souza
Cruz, o Alburrico.
Em
fevereiro de 2000, na revista Caros Amigos, por uma decisão editorial tomada
pelo Sérgio Souza, seu editor, decide-se desvendar o mais bem guardado segredo
da República: o porquê de a grande imprensa esconder o filho de 8 anos de FHC com
uma repórter da Rede Globo. Na verdade, era um segredo de polichinelo.
A
preocupação jornalística veio casada com a salvaguarda ética: não publicar a
foto do menino, oferecida por um colunista de Santa Catarina; não adentrar os
limites da intimidade da família; ouvir e publicar tudo o que Mirian e FHC se
dispusessem a dizer; procurar e ouvir os editores de TODOS os grandes veículos
da mídia nacional.
Assim foi
feito.
Em abril
de 2000, com enorme repercussão, Caros Amigos lancetou o tumor. O então
presidente da República foi procurado e não quis se pronunciar. Os editores dos
principais jornais, revistas e telejornais deram suas versões, todas
publicadas. Mário Sérgio Conti, chefão da Veja, atendeu meu telefonema com
frieza que foi substituída por um ataque de ira e impropérios publicados na
íntegra.
Mirian,
procurada pelo repórter João Rocha, em Barcelona, foi cortês. Pelo telefone
conversaram longamente. Miriam demonstrou querer falar, mas não falou. Já era
uma mulher amargurada, quando disse uma frase reveladora ao ser perguntada pela
paternidade de Tomas: "pergunte para a pessoa pública". Estava
indicada a paternidade de Tomas, é óbvio.
Na
entrevista concedida por Mirian à revista digital BrasilcomZ(AMgóes: uma publicação europeia para brasileiros e demais leitores de língua portuguesa), há algo que
emerge com força e nos surpreende: ela lança dúvidas sobre o exame de DNA
realizado por FHC. Acredita que houve fraude. Desmente que FHC tenha prestado
assistência ao suposto filho, que o tenha visitado em Madri, que mantenha boas
relações com Tomás. E traça um perfil humano devastador, nada a ver com aquele
que a mídia tenta projetar. Mirian Dutra falou muito menos do que sabe.
Como
velho repórter, noto uma situação interessante: Mirian esperou quase três
décadas para fazer o que qualquer mulher faria. Mas o faz apenas agora, dias
após FHC formalizar sua união com a bela e jovem Patricia Kundrat, a quem
presenteou com um imenso apartamento na Avenida Angélica, no aristocrática
bairro de Higienópolis, a poucos metros de sua casa. Valor do mimo: R$ 1 milhão.
Tenho a
absoluta convicção que Mirian, como mulher ofendida na sua dignidade e como
mãe, no mínimo exigirá a realização transparente de um exame de DNA em três laboratórios,
ao mesmo tempo. Todos eles sob a supervisão da Justiça, da Ordem dos Advogados
do Brasil e dos advogados de ambas as partes.
Estão em
jogo três coisas muito importantes. O futuro de Tomás, a vida de Mirian, e -
não podemos ser hipócritas - a imensa e inexplicável fortuna de Fernando
Henrique Cardoso.
(*) Palmério Dória(67 anos) é jornalista e escritor. Trabalhou na Folha de S. Paulo, Estadão e revista Caros Amigos, além de chefe de reportagem da Rede Globo. Sua obra mais recente: O PRÍNCIPE DA PRIVATARIA(Geração Editorial, 2013) - "a história secreta de como o Brasil perdeu seu patrimônio e Fernando Henrique Cardoso ganhou sua reeleição".
(*) Palmério Dória(67 anos) é jornalista e escritor. Trabalhou na Folha de S. Paulo, Estadão e revista Caros Amigos, além de chefe de reportagem da Rede Globo. Sua obra mais recente: O PRÍNCIPE DA PRIVATARIA(Geração Editorial, 2013) - "a história secreta de como o Brasil perdeu seu patrimônio e Fernando Henrique Cardoso ganhou sua reeleição".
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