quinta-feira, 19 de maio de 2016

Empresários   criticam

agressividade de Serra

GGN logocom  a  Venezuela

Empresários brasileiros estão divididos com a postura do ministro interino de Relações Exteriores, José Serra, na relação com os países da América Latina. Alguns temem prejuízos ainda maiores com uma escalada nas tensões entre Michel Temer e Nicolás Maduro. Outros já não esperam muito da Venezuela e consideram que a postura agressiva do Itamaraty faz pouca diferença.
O Valor Econômico ouviu opiniões de executivos brasileiros com negócios no país vizinho. Entre 2001 e 2015, O Brasil acumulou um superávit comercial de US$ 38,9 bilhões com a Venezuela. Em 2015, as exportações caíram 35%. Entre janeiro e abril deste ano, houve uma nova queda, de 61%.
Do Valor Econômico
divide empresários do Brasil
Por Fabio Murakawa
A retórica mais crítica em relação aos "países bolivarianos", adotada pelo Ministério das Relações Exteriores desde que tucano José Serra assumiu a pasta, na semana passada, tem dividido dirigentes e empresários brasileiros com negócios na Venezuela.
Em meio à grave crise econômica no país vizinho, que tem feito minguar o comércio bilateral e acumularem­se atrasos nos pagamentos às exportações brasileiras, alguns temem prejuízos ainda maiores com uma eventual escalada de tensões entre os governos Michel Temer e Nicolás Maduro.
A tradição chavista de retaliar empresas de países de governos considerados "inimigos" só faz aumentar essa apreensão.
Outros, porém, veem uma situação econômica tão grave na Venezuela que acreditam que a postura mais agressiva do Itamaraty não fará muita diferença para seus interesses. Esse grupo inclui empresários satisfeitos com a troca de governo no Brasil e avessos ao modo chavista de fazer negócios, baseado na amizade entre governos e com pouca previsibilidade.
"Há preocupação para que seja mantido o diálogo de parte a parte e que negociações empresariais sejam preservadas", disse ao Valor José Francisco Marcondes, presidente da Federação de Câmaras de Comércio e Indústria Venezuela­Brasil (Fecamvenez).
Para ele, "as relações comerciais entre Brasil e Venezuela são extremamente importantes, considerando­se que a Venezuela tem as maiores reservas de petróleo do mundo e é parceiro do Brasil no Mercosul". "As relações não podem ser preservadas nem prejudicadas por razões ideológicas", afirmou.
Caracas foi alvo da primeira nota diplomática emitida pelo Itamaraty após o afastamento da presidente Dilma Rousseff. No documento, o ministério "rejeita enfaticamente" manifestações de Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua contrárias ao processo de impeachment no Brasil. Todos esses países são governados por esquerdistas tradicionalmente aliados ao PT e haviam classificado como "golpista" o governo Temer.
Em outra nota, o Itamaraty atacou o secretário­geral da Unasul (União das Nações Sul­Americanas), o ex­presidente colombiano Ernesto Samper, também crítico do processo em curso no Brasil.
Ontem, na cerimônia oficial de transmissão do cargo, em Brasília, Serra afirmou que, sob seu mandato, a diplomacia brasileira estará "a serviço do Brasil como um todo, e não mais da conveniência e preferências ideológicas de um partido político e de seus aliados no exterior".
"Estaremos atentos à defesa da democracia, das liberdades e dos direitos humanos em qualquer país, em qualquer regime político", afirmou o chanceler brasileiro, no que foi interpretado por empresários e diplomatas mais como um recado à vizinha Venezuela do que, por exemplo, à China.
Essa postura, porém, gera apreensão entre empresários com negócios com Caracas. "Se receber dos amigos já é difícil, imagina receber de inimigos", disse um deles ao Valor, pedindo anonimato.
Com os dólares minguando na Venezuela, devido à baixa internacional dos preços do petróleo, os venezuelanos devem cerca de US$ 2 bilhões a empresas brasileiras, segundo estimativa de governo e setor privado do Brasil. O número refere­se tanto a atrasos no pagamento de importações como ao atraso na troca de bolívares por dólares para empresas brasileiras que querem repatriar recursos.
A boa relação com o vice­presidente da Área Econômica da Venezuela, Miguel Pérez Abad, que tem amizade com alguns empresários brasileiros, poderia até ajudar ­ se dólares houvesse. "Que diferença faz [a retórica do Itamaraty]?", questiona um executivo, também sob anonimato. "Não faz diferença nenhuma. Os caras [venezuelanos] não estão comprando nem pagando mais nada mesmo."
Outro empresário, do setor alimentício, afirma ter deixado de exportar para a Venezuela nos últimos meses, uma vez que o governo Maduro deixou de pagar adiantado por seus produtos ­ prática comum desde que os dólares começaram a minguar no país vizinho.
Sem dinheiro e crédito na praça, a Venezuela tem cortado drasticamente as importações, tornando ainda mais aguda a escassez de produtos básicos no país. O reflexo no comércio com o Brasil, um dos principais fornecedores de alimentos e medicamentos, foi muito grande.
Entre 2001 e 2015, O Brasil acumulou um superávit comercial de US$ 38,9 bilhões com a Venezuela. Mas, em 2015, as exportações ao país vizinho caíram 35%. E, entre janeiro e abril deste ano, houve um novo tombo, de 61%.
Fernando Portela, da Câmara de Comércio Venezuelano­Brasileira, estima que o comércio bilateral não deva chegar neste ano a US$ 2 bilhões, algo inédito desde 2004.
O sistema irracional de câmbio e o controle de preços desestimulam a produção local e funciona como um convite ao contrabando dos produtos importados. Relatos de saques a supermercados e de hospitais com falta até de antibiótico são cada vez mais frequentes.
Segundo projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI), o PIB venezuelano deve se contrair 8% em 2016. A inflação, que fechou o ano passado em 180,9%, deve disparar a 700% neste ano.

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