domingo, 18 de dezembro de 2016

Aonde a Globo

quer chegar?

André Araújo                   

 
O jornalista Roberto Marinho construiu seu império de comunicações errando pouco e acertando muito. Soube sempre colocar suas fichas nos cavalos certos e poucas vezes apostou mal, apoiando, çpo exemplo, a revolta paulista de 1932 e desembarcando tardiamente do golpe militar de 1964 e do governo Collor.
Roberto Marinho passou a integrar a direção de O GLOBO após a morte do pai, em 1925.
Seu período no jornal atravessou as presidências de Arthur Bernardes, Washington Luis, Getulio Vargas (governo provisório de 1930, governo constitucional de 1934 e 'Estado Novo' de 1937), Eurico Dutra, Getúlio novamente, Jango, governo parlamentarista de Santiago Dantas e Hermes Lima, Castello Branco, Costa  Silva, junta militar, Médici, Geisel, Figueiredo, Sarney, Collor e Lula, portanto 18 períodos ou regimes presidenciais, fato raro em qualquer parte do mundo para um dono de jornal.
Apoiou Getulio em 1930(uma jogada arriscada) e o Estado Novo varguista, a ponto de integrar o Conselho Nacional de Imprensa, órgão do DIP (o pró-nazista Departamento de Imprensa e Propaganda). Conseguiu em 1944 sua primeira rádio comprada à RCA Victor. Nas eleições de 1945 e 1950 apoiou a UDN e seu candidato Eduardo Gomes, mas se compôs com Dutra e Getúlio, este até 1953, quando desembarcou do varguismo. No Governo JK estava discretamente na oposição, mas moderadamente por Juscelino tê-lo autorizado a idealizar TV Globo, em área até então dominada pela TV Tupi de seu inimigo visceral Assis Chateaubriand(que foi embaixador brasileiro em Londres e introdutor da televisão no Brasil(1950, em São Paulo).
Errou em dois timings: nos desembarques do governo militar e  do governo Collor.  Com FHC estava às mil maravilhas, porém com Lula se compôs sem gostar.
A partir das apostas políticas certas, o Sistema GLOBO saiu de um jornal de cidade do terceiro mundo para um dos maiores grupos de mídia do planeta, todavia sempre crescendo a partir do timoneiro Roberto Marinho. Sem ele, o jogo mudou e a travessia não é tão segura.
A GLOBO de hoje não tem linha política minimamente definida, parece biruta de aeroporto.
Nos tempos do 'doutor' Roberto, grandes cérebros ajudavam a dar a linha. Amigos pessoais como Roberto Campos e Jorge Serpa, este último conselheiro por 50 anos. Serpa era o Talleyrand brasileiro: redigia os discursos de Goulart (inclusive o fatídico de 13 de março). Preso pelos militares, passou-se para o lado deles e se tornou próximo do regime; redigia editoriais políticos do jornal. Serpa era muito mais que um simples formulador de ideias: era amigo pessoal de Marinho, um dos poucos  habituais frequentadores de sua casa de praia nos fins de semana.
Hoje analiso os programas políticos da GLOBONEWS (não vejo a Globo aberta há décadas) e constato a parcialidade tosca, banal, caipira, que não havia nos tempos do 'doutor' Roberto. Desapareceram completamente a sutileza, a finesse, a sofisticação das análises.
Exemplos: Como a GLOBONEWS apoia cegamente a Lava Jato e todas as suas ramificações, não há um mísero contraponto de opiniões. Malham o Congresso de manhã, tarde e noite, especialmente Renan, sem se avergonharem da parcialidade. No ESTÚDIO I desta sexta()16), a frenética Maria Beltrão, que várias vezes malhou o regime militar do qual seu pai foi importante Ministro, leu e-mails das "redes sociais",  sem nenhuma exceção, malhando Renan. Será que não havia uma ou outra opinião divergente? Não é normal todos os espectadores pensarem igual.
A "tropa de choque" da 'onipresente' Lo Prete(a que horas será que ela dorme e faz refeições?), tem a linha: escrachar sem dó o Congresso, elogiar sem nenhum reparo juízes e promotores(aqueles que "fazem a diferença"), tudo  avalizado pelo 'oráculo' Merval Pereira, um personagem de Lima Barreto do começo do século passado até no bigode português, para o qual o jogo político, sob o qual a Globo nasceu e cresceu, 'sempre foi limpo'. Daí o espanto com a corrupção de hoje: Merval,  sempre se chocando, com "isto é um absurdo" e nada bate com sua visão de mundo. 'É um absurdo!' Mas a Globo poupa cuidadosamente o BNDES, visto lá ter operações em curso, assim como seus maiores clientes. Então deixe quieto!.
Quando a falastrona Lo Prete permite, Merval fala, desfilando obviedades, platitudes e lugares comuns, sempre na linha favorável ao Judiciário e contrária aos políticos, para os quais ele tapa o nariz. Parece que o sonho da Globo é uma Presidência asséptica, descontaminada de políticos, classe da qual Lo Prete and friends têm horror.
Quanto à economia, a GLOBO apostou desde o inicio na dupla Meirelles-Goldfajn e seus porta-vozes (fraquíssimos), Sardenberg e João Borges, têm avalizado a política a la grega quem 'através da austeridade' iria 'restabelecer a confiança e fazer voltar os investimentos'. Uma imensa asneira cuja ficha só caiu nos últimos quinze dias, deixando Sardenberg, Borges e até a simpática Juliana Rosa no meio da escada.
Por que a GLOBONEWS, com todos os seus imensos recursos de correspondentes (em geral muito bons) mundo afora, não entrevista Joseph Stiglitz, Dani Rodrick, Paul Krugman ouvindo o que eles têm a dizer sobre a crise econômica brasileira? Por que avalizar dois medíocres que não têm três ideias na cabeça e estão levando o país ao fundo do abismo? Afinal, a crise derruba o faturamento até das redes de televisão, penso eu. Até agora a GLOBO referendou a recessão, com a fala de Goldfajn n essa sexta(16), "a fraqueza da economia ajuda a combater a inflação", assim como a morte de pacientes em um hospital público ajuda a economizar na comida dos doentes. Um dito imbecil desses não mereceu o mínimo reparo dos assustados Sardenberg e Borges que sequer comentaram e muito menos fizeram algum reparo, tal qual "no cemitério da Consolação, depois que fecham os portões, não há inflação".
O maior sábio de economia da GLOBONEWS é Ricardo Amorim, "garoto de mercado"  raso como um pires  de café expresso, admirador sem reservas da política Meirelles-Goldfajn de austeridade, que escreveu um livro mostrando a 'maravilha' que será o Brasil com a nova política econômica da PEC 55, sob um título sugestivo, APÓS A CRISE. O sarcástico Lucas Mendes, em tom de galhofa lhe cobrou, no último Globonews um "e então nada do que você previu está acontecendo", para profunda irritação de Amorim que disse "acertei todas", por exemplo 'acertei que Dilma perderia o impeachment'.
É esse o nível do jornalismo econômico da Globo. Com todo dinheiro que têm, não podiam achar bons cérebros? O Brasil é uma fábrica de bons pensadores econômicos e não precisa ser um fixo, o melhor são comentaristas rotativos como na TV européia ou na TV pública americana. Mas não vi em nenhum programa MANHATTAN CONNECTION um economista de primeira linha dando sua opinião sobre a crise brasileira, por exemplo, do Institute for New Economic Thinking, que fica lá mesmo em Nova York e que tem nomes mundiais,  Prêmios Nobel  como Krugman e Stiglitzs. Se convidados eles irão com o maior prazer. Conversei com alguns deles sobre isso, o programa nem sabe que existe o INET,  fórum universalmente conhecido, fundado em 2008 por causa do fracasso das fórmulas monetaristas causadoras da crise, as mesmas da dupla Meirelles/ Goldfajn, a turma do zurro.
Já a inacreditável Mara Luquet tem boas soluções, para os que estão com dívidas nos bancos: "você precisa negociar, se o gerente não baixar os juros você atravessa a rua e  vá para outro banco". O aposentados não conseguem manter seus orçamentos? Vá morar na Costa Rica, lá você vive bem com mil dólares por mês, esquecendo que também se vive bem com mil dólares em Caratinga, cidade mineira da Zona da Mata. Fico imaginando um metalúrgico aposentado do ABC, com cinco filhos e nove netos, a sogra, quatro irmãos e cinco cunhadas fazendo mudança para a Costa Rica, seguindo os conselhos da Luquet, afinal lá se vive bem (será numa cabana?).
A última da Luquet é para o imortal Chico Anysio: o desemprego não é culpa da crise, é que o trabalho mudou e você não sabe. Você não precisa mais de emprego; por exemplo, eu tomo muita água de coco, então eu descobri pela internet uma moça que entrega coco em casa, esse vai ser o novo trabalho do mundo. Você se vira pela internet; o emprego comum acabou. Você em casa pode fabricar aço, pneu, automóvel, inseticida e sair vendendo pela internet, sacou?
Até o razoável programa Painel, o carro chefe de grandes questões da GLOBONEWS, não consegue sair de um carnê de vinte nomes repetidos à exaustão. Mas com exceções, como Carlos Mello e Murilo Aragão, muito bons, os outros são todas da mesma linha conservadora moralista. Não há a pimenta do debate, parece que a discussão não interessa, só o reforço do que a GLOBO já pensa.
Uma ressalva para a jornalista Monica Waldvogel. Seu programa ENTRE ASPAS tem mantido um nutrido debate sobre os tópicos levados à discussão. No último,  o dinossauro da PUC/Rio José Marcio Camargo e um jovem economista da Unicamp quase se pegaram. Isso tem acontecido em vários programas da Monica, quase sempre com debatedores de linhas opostas sobre o tema, afinal pertinente elogiar quando é o caso.
Já a 'lendária'  Miriam Leitão é um caso a parte. Depois de ouvi-la atentamente por 30 anos,  não descobri o que ela pensa da vida, da política e da economia. Não tem uma linha conservadora ou contestadora, pode ser uma coisa de manhã e outra à noite. Em política está à esquerda de Frei Betto, em economia está à direita de Milton Friedman, mas às vezes mistura o baralho. Não sei realmente o ponto de vista que ela representa, além do fato de se mostrar sabichona em qualquer assunto.
Uma coisa todos, 'os' e 'as'  globetes, têm em comum: o profundo desprezo pelo Brasil, como país, povo, sociedade, política e economia. O sonho global está fora do Brasil; caso pudessem, se mudariam para Miami. Diego Mainardi é uma espécie de síntese dos globetes, do seu horror pelo País, de sua admiração rastaquera pelo exterior, que levaram uma sova, todos, na eleição do Trump, pois  nunca esperavam um tipo desses ser Presidente da 'adorada' terra e agora  não sabem como digeri-lo. Trump faz os EUA se parecerem com o Brasil. Como fazer?

Nenhum comentário:

Postar um comentário