Xadrez de Bolsonaro, do autoritarismo militar e do pacto nacional
LUÍS NASSIF, no JORNAL/GGN
Tem-se uma
certeza: o pacto político pós-Constituinte acabou. O bipartidarismo
esfacelou-se com o fim virtual do PSDB. O PT mantém-se como o maior partido do
país, mas ilhado por uma enorme corrente de antipetismo que ameaça a eleição de
Fernando Haddad e, muito mais ainda, um eventual governo, em caso de sua
vitória, por ora difícil(mas não
impossível). ||| No plano
racional, em um ponto qualquer do futuro, o PT ampliaria seu escopo, de
representante de movimentos sociais e sindicatos, para um autêntico partido
social-democrata, atraindo setores democráticos e progressistas órfãos do
modelo atual – e até do PT atual. Na outra ponta, haveria um movimento em
relação ao centro-direita, liderado por algum político mais capacitado que
Bolsonaro. ||| A indecisão
dos principais atores políticos se prende a uma visão equivocada do que seria
um governo Bolsonaro. Aposta-se na vida breve, devido à mediocridade ampla do
candidato. Nesse quadro, a) - o PT pretende assumir a liderança da oposição no momento seguinte, sem
que a Executiva precise abrir lugar à mesa a outras forças políticas
democráticas, órfãs do bipartidarismo atual; b) - Ciro Gomes aposta em sua volta como uma espécie de Dom Sebastião, retornando
para unificar e salvar o país da invasão bárbara; c) - FHC ficará onde sempre esteve e de lá não arredará pé. É mais fácil um
camelo passar pelo buraco de uma agulha, e Bolsonaro se tornar um democrata, do
que FHC cometer um gesto digno sequer; d) - o PSDB tradicional tentará juntar alguns fragmentos e se abrigar em
algum barco no meio do oceano, aguardando alguma embarcação maior para se
atracar; e) - A Globo já alinhou todos seus comentaristas ao editorial de dias atrás,
no qual finge que acredita que Bolsonaro e se tornará um democrata. Com
Bolsonaro eleito, não conseguirá se esconder atrás do estado de exceção
judicial. Como mais influente agente do Sistema, provavelmente será
tratada como um inimigo implícito, por sua arrogância e sua posição liberal nos
costumes. Sem problema. Se necessário for, sua próxima estrela será Regina
Duarte de burca. ||| Todas essas
estratégias partem de um mesmo diagnóstico, uma espécie de autoilusão: depois
de num breve período de caos, começará o novo tempo da política, no qual tudo
será zerado, a democracia voltará a se impor e haverá o início de um novo ciclo
democrático. Nada indica
esse final feliz. O cenário mais
provável será: Movimento 1 – a
demolição acelerada das instituições, finalizando o trabalho de Michel Temer,
quebrando instrumentos centrais de política econômica, social, educacional,
tecnológica. Movimento 2 –
a indicação de três novos Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF),
consolidando o movimento oportunista de direita radical iniciado por Luís
Roberto Barroso, Luiz Edson Fachin e Luiz Fux e, agora, pelo novo
brasilianista, Dias Toffoli. No Ministério Público Federal, em vez de um
Procurador Geral apenas submisso aos radicais da base, colocará um líder
autêntico que mobilizará as tropas contra os dissidentes da sociedade civil. Movimento 3 –
a indicação de militares para cargos-chave nos ministérios. Movimento 4 –
ataques indiscriminados a movimentos sociais, sindicatos e universidades, com a
combinação de milícias públicas e privadas, procuradores e juízes ligados ao
MBL.
O Desfecho provável
Pelo nível
do capitão, pelos aventureiros que se aproximaram dele, pela absoluta
incapacidade de recuperação da economia com as propostas de Paulo Guedes, pela
mediocridade absoluta de Bolsonaro para mediar os conflitos internos de seu
governo, se seguirá um período de profundas turbulências. ||| No início, o
governo Bolsonaro não será expressão do poder militar, mas apenas um celerado
no poder. Com o caos, haverá razões de sobra para as Forças Armadas entrarem em
cena, contendo as loucuras até o limite de substituir Bolsonaro por um governo
militar autêntico, tocado pelo candidato a vice-presidente general Mourão. Aí, a
loucura ultradireitista será submetida a um modelo racional e inevitavelmente
autoritário, expressão autêntica da racionalidade militar. ||| No plano
econômico, um bom exemplo é o que ocorreu recentemente. Antes de se verem na
perspectiva de poder, o discurso dos generais era uma réplica do neoliberalismo
fútil da Globonews. Quando
começaram a se debruçar sobre questões reais, caiu a ficha sobre o papel de
estatais estratégicas. O próprio Bolsonaro veio a público declarar que jamais
abrirá mão da Eletrobras como geradora de energia, e apontou o risco da invasão
chinesa no Brasil. Certamente não chegou a tal conclusão amparado em seus
próprios conhecimentos. ||| Os militares não
cometerão as barbaridades anunciadas por Bolsonaro. Manterão políticas
sociais, mas despregadas de qualquer possibilidade de ativismo social. Por sua
própria característica – de não abrir mão do controle sobre todas as variáveis,
comportamento típico da disciplina e da estratégia militar – será um governo
controlador na economia e, principalmente, na política. ||| O próprio
fato do poder civil ter levado o país até o limite do caos, na figura de
Bolsonaro, será o fator legitimador do próximo tempo. Aí o país
encontrará de novo a paz dos cemitérios. E todos aqueles que se iludiram em um
momento crucial para o país, terão o resto de suas existências para fazer
autocrítica e chorar suas dores lancinantes.
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