A vitória da resistência
a qualquer mudança
civilizatória
André Singer (*)
Em sua coluna deste sábado(14), na Folha de S. Paulo, o ex-porta-voz da Presidência(governo Lula) André Singer analisa as causas e consequências da abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma, para ele "uma das lutas mais dramáticas da histórica democrática brasileira". Ele diz que o lulsimo estava nas cordas desde quando a presidente reeleita escolheu Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, entregando "a condução do país ao projeto austericida que condenara na campanha eleitoral".
Além do fator econômico, há também as revelações e a manipulação da Operação Lava Jato, "a Mãos Limpas Nacional". Singir que Dilma subestimou o tamanho destes dois fatores. "Independentemente das falhas de avaliação de Dilma, o lulismo foi incapaz de oferecer uma narrativa coerente sobre a avalanche de acusações formuladas pelo Partido da Justiça sediado em Curitiba", diz Singer.
Por último, ele afirma que "a traumática derrubada do lulismo" interrompe a tentativa de "integrar os pobres por meio de uma extensa conciliação de classe". Leia mais abaixo:
Nocaute
O lulismo estava nas cordas desde a quinta-feira, 27 de novembro de 2014, em que a presidente reeleita anunciou que havia decidido entregar a condução da economia do país ao projeto austericida que condenara na campanha eleitoral. Um ano e meio depois, na aurora desta quinta-feira (12), o exausto lutador caiu. Ao afastar Dilma Rousseff da Presidência por 55 a 22 votos, o Senado encerrou talvez uma das lutas mais dramáticas – embora perca para a de 1954 – da história democrática brasileira.
Haverá ainda prorrogação, mas só um milagre reverterá o jogo no espaço senatorial em que se fará o julgamento dos inexistentes crimes da mandatária afastada. Um bloco partidário e social comandado pelo PMDB se formou para isolar, desmoralizar e, caso possível, extinguir o arco de forças comandado por Lula. O lulismo não morreu, mas talvez sejam necessários anos para reconstruir as condições de disputa perdidas na manhã da quinta passada (12).
Pois embora o fator econômico tenha sido decisivo, não se tratou da mera derrocada de um governo associado a desemprego, inflação e queda da renda. Foi também o resultado das revelações e da manipulação da 'Mãos Limpas' nacional, conhecida como 'Lava Jato'. Dilma subestimou o tamanho dessas duas encrencas, que apareceram com nitidez no último ano do seu primeiro mandato.
Se a antiga ministra da Casa Civil tivesse percebido a força da coalizão capitalista consolidada em torno do ajuste recessivo assim como o potencial que a delação premiada traria à investigação na Petrobras, o mais racional era ter entregue a recandidatura a Lula. O ex-presidente reunia melhores condições para o pugilato de pesos-pesados.
Só o tempo dirá em que ponto do percurso Sergio Moro, Deltan Dallagnol e outros personagens das investigações resolveram colocar a bomba atômica que controlavam a serviço da demolição do lulismo. De toda maneira, em março deste ano, quando o juiz curitibano fez a condução coercitiva de Lula e a divulgação do diálogo deste com Dilma, ficou claro que já não havia isenção.
Independentemente das falhas de avaliação de Dilma, o lulismo foi incapaz de oferecer uma narrativa coerente sobre a avalanche de acusações formuladas pelo Partido da Justiça sediado em Curitiba. De outro lado, a mídia estimulou um clima de caça às bruxas decisivo para cimentar a maioria que deu suporte ao golpe parlamentar.
Com a traumática derrubada do lulismo, interrompe-se mais uma vez a tentativa — no fundo a mesma de Getúlio Vargas — de integrar os pobres por meio de uma extensa conciliação de classe. Venceu de novo a forte resistência nacional a qualquer tipo de mudança verdadeiramente civilizatória. Mesmo a mais moderada e conciliadora.
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