Por que você só conhece DOIS
dos TRINTA E UM candidatos à
presidência dos Estados Unidos?
Modelo eleitoral que favorece a manutenção do bipartidarismo entre Republicanos e Democratas constitui uma barreira difícil de ser superada para terceiras opções...
BRIAN SNYDER / REUTERS
Na próxima terça-feira, 8, os norte-americanos irão às urnas escolher seu novo (ou sua nova) presidente, finalizando uma corrida eleitoral que se iniciou ainda nas primárias, aproximadamente 21 meses antes da votação, em uma das disputas mais longas da História dos EUA.
O debate polarizou de maneira definitiva no início de julho, quando os partidos Democrata e Republicano definiram internamente seus candidatos em 2016 - Hillary Clinton e Donald Trump, respectivamente. Desde então, a cobertura eleitoral em todo o mundo se concentra nas duas figuras, dando a entender que são as únicas opções à disposição.
Nem mesmo a alta rejeição aos dois candidatos disponíveis serviu para dar maior visibilidade a quem poderia surgir como alternativa. Em maio, quando a candidatura dos dois já parecia certa pelas pesquisas, Trump era visto de maneira “fortemente desfavorável” para 53% dos americanos. E Clinton, por 37%.
Os dois índices superaram o recorde até então sustentado pelo republicano George W. Bush em 2004, o primeiro a ultrapassar os 30% de rejeição.
Os EUA contam, hoje, com 29 candidatos confirmados à presidência além de Clinton e Trump, sem considerar os outros que não aparecem nas cédulas, mas podem ser opção na hora da votação. Entenda melhor como isso acontece.
Diferentes formas de se candidatar
JONATHAN DRAKE / REUTERS
CÉDULA DE ELEIÇÃO PRESIDENCIAL AMERICANA NO ESTADO DA CAROLINA DO NORTE
No Brasil, para uma pessoa se candidatar a qualquer cargo eletivo, precisa ser filiada a um partido político registrado no Tribunal Superior Eleitoral. Essa obrigação não existe nos EUA, onde há três formas de concorrer à presidência:
Partido: um candidato pode ser nomeado como o representante de seu partido como resultado da votação das primárias. É o caso de Clinton e Trump, mas existem outros.
Independente: um candidato que não é filiado a nenhum partido mas quer que seu nome apareça na cédula de votação. Para isso, precisa coletar assinaturas de apoio. O número necessário de assinaturas varia em cada Estado.
Write-in: candidatos cujos nomes não aparecem na cédula, mas que podem receber votos caso o eleitor escreva seu nome no papel a ser depositado na urna.
As diferentes opções de candidatura permitem que uma variada gama de personagens se candidatem ao cargo.
Basta que o interessado preencha os formulários exigidos pela Comissão Eleitoral Federal. Alguns deles participam do pleito de forma séria, enquanto outros são mais anedóticos.
A votação presidencial nos EUA é dividida por Estados, e cada unidade da federação tem uma legislação eleitoral diferente.
Com isso, uma pessoa pode conseguir cadastrar sua candidatura em um Estado, mas não conseguir em outro. Portanto, se não cumprir os requisitos de candidatura no Texas, por exemplo, não pode receber votos por lá.
Nesta eleição, apenas três candidatos conseguiram registro em todos os 50 Estados americanos e poderão ser votados em todos eles - Clinton, Trump e Gary Johnson.
Mas existem ainda outros 28 candidatos que podem ser votados em pelo menos um Estado, totalizando 31 nomes na disputa.
Há ainda uma lista com mais de 500 outros nomes que entram no caso de “write-in” em pelo menos um Estado. São nomes que cumpriram somente parte dos requisitos exigidos. Podem ser tanto independentes quanto de partidos pequenos locais.
Dessa forma, eles não terão seus nomes escritos em nenhuma cédula do país, mas poderão receber votos no Estado onde cumpriram parcialmente as exigências eleitorais. Nesse caso, quem for votar tem de escrever o nome do candidato na cédula.
Alguns dos candidatos alternativos:
JIM YOUNG / REUTERS
CANDIDATO À PRESIDÊNCIA, GARY JOHNSON FALA EM UNIVERSIDADE DE CHICAGO
Entre os candidatos alternativos com partido, os mais fortes são Gary Johnson, ex-governador do Estado de Novo México e representante do Partido Libertarianista; e Jill Stein, representante do Partido Verde e a mulher que mais recebeu votos para presidente na história americana, em 2012 - cenário que deve mudar com Clinton em 2016 (ela poderá receber votos em cerca de 40 dos 50 Estados).
Já Evan McMullin é o caso de candidatura independente (sem partido) mais importante nessas eleições. O candidato de Utah, que já trabalhou na CIA e tem carreira em cargos políticos, terá seu nome presente nas cédulas de apenas 11 Estados como um independente. Em outros, pode ser votado como “write-in”, e em outros Estados, não pode receber votos de nenhuma maneira. No total, é o único independente que pode receber votos em mais de 15 Estados.
Outro candidato independente famoso nos EUA é o ativista e artista performático Vermin Supreme. Conhecido por levar sempre uma bota na cabeça e prometer pôneis de graça para todos se for eleito, ele vem tentando um cargo eletivo desde a década de 1980. Apesar da extravagância, Supreme ficou em quarto lugar nas primárias do partido democrata no Estado de New Hampshire.
Por que nenhum deles tem chance
JIM YOUNG / REUTERS
TRUMP E HILLARY FALAM DURANTE DEBATE À PRESIDÊNCIA DOS EUA
Cada um dos 50 Estados americanos tem suas próprias leis eleitorais. Adaptar-se a cada uma demanda poder financeiro e logístico dos candidatos. Não fazer parte de um dos dois grandes partidos (Republicano ou Democrata), nesse sentido, é uma dificuldade praticamente proibitiva.
Fatores que impedem
terceiros
de competir
VISIBILIDADE
A presença nos debates é definida pela popularidade apontada em pesquisas preliminares. Os candidatos que não são nem democratas nem republicanos dificilmente têm representatividade expressiva nas pesquisas nacionais. Com isso, ficam fora dos debates. Fora dos debates, têm menos visibilidade, criando um ciclo difícil de superar.
PERMISSÃO PARA SER VOTADO
Cada Estado tem suas próprias regras eleitorais. Por isso, um candidato a presidência precisa se adaptar a todas elas individualmente, o que custa muito caro. Caso não o faça, não poderá ser votado em alguns Estados, praticamente anulando suas possibilidades de ser eleito.
FALTA DE ESTRUTURA
Mesmo quem tem dinheiro, não tem tamanho. O milionário ex-prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, pensou em se candidatar em 2016. Mas, ao perceber que seria impossível competir com os dois grandes partidos em todos os Estados, achou melhor não entrar na briga, uma vez que com certeza não seria eleito, e ainda poderia ajudar a eleger Trump tirando votos da Hillary.
A situação de Bloomberg não é nova. Em 2000, por exemplo, muitos atribuem a vitória de George W. Bush à presença de Ralph Nader, do Partido Verde. Com uma campanha forte, ele teria acabado “roubando votos” do democrata Al Gore, permitindo que Bush vencesse em Estados mais importantes.
Pedidos por mudança
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JILL STEIN, CANDIDATA DO PARTIDO VERDE À PRESIDÊNCIA AMERICANA
O modelo norte-americano é desenhado para “forçar um consenso” na nação, segundo a especialista Elaine Kamarck, do Brookings Institute. Ela explica que o favorecimento ao bipartidarismo faz com que ambos os concorrentes evitem ideologias radicais, conseguindo coletar a maioria dos eleitores dentro do espectro direita-esquerda.
Esse modelo é consagrado no país, e as várias barreiras institucionais legalmente estabelecidas para a criação de novos partidos são uma forma de encorajar a manutenção do sistema bipartidário.
O professor na New York University, Steven Brams, explicou ao Nexo as diferenças entre modelos eleitorais e as implicações que resultam na escolha de cada um deles. A entrevista pode ser lida aqui.
Apesar disso, segundo pesquisa da NBC/Wall Street Journal, 83% dos americanos acreditam que esse sistema é problemático, e vozes começam a se levantar por mudanças.
Jill Stein, atual candidata pelo Partido Verde, está entre as pessoas que apontam tais problemas. Para ela, o atual modelo força os eleitores a votarem nos candidatos “menos piores”, transformando a democracia no oposto do que, para ela, deveria ser.
“Se você não pode colocar seus valores no seu voto, então a democracia está perdida. Não temos uma bússola moral. E é exatamente onde estamos nesse momento.” (
Jill Stein - Candidata à presidência dos EUA pelo Partido Verde, em entrevista à “Al Jazeera”)
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