Ao escolher Moraes para o STF, Temer está cumprindo a trama de Romero Jucá
Moraes pode ter
um impacto significativo nos casos da Lava Jato. Suas ações podem beneficiar
não apenas Temer, mas também figuras importantes do PSDB...
Glenn Greenwald
Foto: Marcelo Camargo(Ag. Brasil) |
A grande maioria dos escândalos durante a Presidência de Michel Temer pode ser entendida a partir de um evento crítico: a divulgação da gravação em que seu aliado mais próximo, Romero
Jucá (PMDB/RR), secretamente descrevia o “pacto nacional” para interromper a
Lava Jato. O plano – que Jucá dizia explicitamente ter sido aprovado pelas
instituições nacionais mais importantes: líderes de partidos, a mídia, os
militares e o STF (com exceção de Teori Zavascki, morto
recentemente) – envolvia o impeachment de Dilma e, posteriormente, o uso do
poder nas mãos do PMDB e do PSDB para impedir a continuidade das investigações
sobre a corrupção.
Desde
o começo de sua presidência, Temer levou ao poder exatamente os políticos de seu próprio partido e do PSDB mais envolvidos nos escândalos. Agindo
assim, enviava uma clara mensagem: a remoção da presidente democraticamente
eleita asseguraria que a maioria dos políticos corruptos em Brasília não seria
punida, mas recompensada, protegida e promovida: exatamente como Jucá – ele
mesmo implicado na Lava Jato – descreveu.
E,
é claro, não é coincidência que o próprio Jucá, depois de forçado a renunciar
a seu cargo de ministro quando as gravações foram reveladas, tenha
voltado rapidamente como líder de Temer no Senado; ele tem agora mais poder do
que nunca.
Há
também leis que Temer e seus aliados tentaram impor ao país: anistia àqueles
que aceitaram contribuições de campanha ilegais, além de várias medidas para enfraquecer as investigações e os indiciamentos. Algumas destas
eram exageradamente imorais e obviamente corruptas para serem aprovadas, mas
outras – inclusive a deformação das medidas anticorrupção propostas pelo
Ministério Público – passaram. A postura de Temer em relação à Lava Jato
foi exatamente como Jucá disse que seria: estancar a sangria, para seus aliados
mais próximos no PMDB e no PSDB e também para o próprio presidente.
Por
mais flagrantes que sejam esses casos, no entanto, nada se compara ao último
passo de Temer quando se trata de tentar compreender em que medida o plano de
Jucá ainda está em andamento. A escolha de um agenciador subserviente do PSDB como Alexandre de Moraes para substituir
Zavascki no STF deveria dissolver qualquer dúvida sobre o que é Temer e os
motivos pelos quais Dilma foi removida em prol de sua ascensão ao Palácio da
Alvorada.
Se
o Senado confirmar sua escolha – e ninguém é rejeitado há mais de 100 anos –
significará que um dos poucos juízes dedicados a proteger a Lava Jato será
substituído por um operador político afundado em escândalos políticos,
desprovido de estudos jurídicos sérios, e claramente dedicado a proteger seus aliados políticos, ou
seja, as figuras mais poderosas de Brasília ameaçadas pelas investigações de
corrução.
Como
juiz do STF, Moraes pode ter um impacto significante nos casos da Lava Jato levados à
Corte. Suas ações podem beneficiar diretamente não apenas Temer, que o escolheu
tanto para o Ministério da Justiça quanto para o STF, mas também figuras
importantes do PSDB que até agora foram preservadas nos procedimentos da Lava
Jato. Temer escolheu Moraes depois do pesado lobby de figuras influentes do
PSDB, que claramente veem grande vantagem em ter um aliado político ao invés de
um juiz independente no lugar de Zavascki. Ao escolher alguém com esse perfil,
Temer está – uma vez mais – demonstrando desprezo pelo estado de direito, pela
independência da justiça e pela população brasileira.
A
escolha de Moraes é, aparentemente, um passo largo demais até mesmo para a
mídia brasileira que vem insistentemente protegendo Temer. Parte disso se deve
a um sentimento de traição: eles asseguravam ao público que a remoção de Dilma
e o empoderamento de Temer não impediria as investigações sobre a corrupção.
De
fato, o Editor Chefe da revista Época, Diego Escosteguy, dois dias antes da
escolha de Temer, declarou: “Alexandre de Moraes não
será escolhido” (ele afirmou que havia dito isso porque Temer prometera que Moraes não seria escolhido). Entretanto, a Época produziu um
vídeo dramatizando as controvérsias de Moraes, enquanto as estrelas
pró-impeachment mais proeminentes da Globo, como Miriam Leitão, estão criticando,
leve e educadamente, a escolha de Temer (“Temer errou... Esta não é a
hora de escolher para o STF alguém da sua copa e cozinha e membro do PSDB”).
Mas
nada disso demonstra com precisão o quão corrupta – e esclarecedora – é a
escolha de Temer. Ela não mostra apenas que ele está totalmente comprometido
com o acordo que o levou ao poder, exatamente como descrito por Jucá, mas, para
além disso, mostra que ele está disposto a implementar o plano de forma aberta,
na cara de todos. Temer deixou claro que ele não se importa com sua
impopularidade. Ele sabe que o “pacto nacional” ainda está em vigor e que a
mídia e as facções políticas mais poderosas aceitam o seu papel: fazer o
trabalho sujo – desde planos de austeridade até a eliminação da Lava Jato – que
outros políticos não farão.
O
“pacto nacional” revelado por Jucá era baseado na crença de que não importa
quão ilegítimo e medíocre ele seja, Temer é a única alternativa da nação, a
pessoa certa para consertar o maior problema: que as figuras políticas mais
importantes de Brasília, de Serra a Aécio, passando pelo próprio Jucá, sejam
ameaçados por estas investigações sobre a corrupção. Temer implementou
fielmente este pacto, e colocar seu aliado do PSDB na Suprema Corte do país é
um dos passos mais importantes até agora em sua missão.
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