sábado, 4 de fevereiro de 2017


Médicos têm de reagir  ao
vazamento  criminoso  de 
exames  de  Dona  Marisa  

Medicina perde respeito da sociedade por ato antiético  >>  Envolvidos rasgaram seus juramentos de Hipócrates  >>  Estamos divididos pelas opções políticas, e isso é sórdido...
LUÍS COSTA PINTO (*)                             Resultado de imagem para imagem da logo do Poder360

AS BESTAS DE JALECO

Outrora uma profissão abraçada por abnegados ascetas, a ponto de ser comparada por muitos a um sacerdócio, a Medicina parece ter se convertido aqui no Brasil a uma seita satânica seguida como profissão de fé por seres grotescos – sem alma, sem cérebro, sem compreensão do mundo, sem dó ou compaixão.
Exagero e tomo a parte pelo todo porque os médicos brasileiros precisam, seja por iniciativas das entidades de classe, seja por eles mesmos atuando individualmente, reagir de forma dura e organizada à ínfima minoria integrada por seres abjetos como a reumatologista Gabriela Munhoz, o cardiologista Ademar Poltronieri Filho, o urologista Michael Hennich e o neurologista Richam Faissal Ellakkis.
Horas depois de Marisa Letícia da Silva dar entrada no Hospital Sírio Libanês, há 10 dias, com um quadro de Acidente Vascular Cerebral grave, Gabriela Munhoz divulgou em grupos de Whatsapp dados do prontuário médico da ex-primeira-dama cuja morte cerebral foi anunciada ontem (2.fev.2017). Não o fez em busca de auxílio. Eram informações sigilosas de uma paciente –fosse quem fosse– e o simples fato de compartilhá-las configura um atentado à ética médica.
Ao compartilhamento de Munhoz seguiu-se a disseminação dos dados pessoais da mulher do ex-presidente Lula por Poltronieri Filho. A partir dali o urologista Hennich desdenhava da paciente, fazendo piadas com ela. Tudo culminou com a torcida declarada do neurologista Ellakkis para que Dona Marisa, uma mãe carinhosa, avó dedicada, companheira solidária, mulher de rara fibra e militante valorosa de causas sociais e políticas, evoluísse a óbito – para usar o jargão dessas bestas de jaleco.
Esses fdp vão embolizar ainda por cima”, escreveu, em referência ao procedimento de provocar o fechamento de um vaso sanguíneo para diminuir o fluxo de sangue em determinado local. “Tem que romper no procedimento. Daí já abre pupila. E o capeta abraça ela”, escreveu Ellakkis, que prestava serviços no Hospital da Unimed São Roque, no interior de São Paulo, e em outras unidades de saúde da capital paulista(AMgóes: foi demitido nessa sexta-feira/3, informou a Unimed), segundo relato de apuração jornalística efetuado por O Globo e divulgado no site do jornal.
Os valores dessa verdadeira quadrilha de médicos que rasgaram seus juramentos aos princípios de Hipócrates e espicaçaram qualquer solidariedade humana podem –e devem– ser comparados aos patéticos protestos contra o desembarque de doutores e doutoras cubanos no âmbito do programa Mais Médicos levado a cabo no primeiro governo da ex-presidente Dilma Rousseff. Podem e devem, ainda, ser analisados em paralelo com a atitude criminosa de ortopedistas do Distrito Federal que prescreviam cirurgias de colocação de próteses ósseas desnecessárias e introduziam no corpo dos pacientes peças de segunda mão –matando muitos de infecção, restringindo o movimento de outros e assaltando-os abertamente ao superfaturar os procedimentos clínicos e cirúrgicos.
Somam-se os exemplos e os paralelos. Multiplica-se a solidariedade da infâmia, com a corporação protegendo aos seus e deixando a sociedade à mercê da sorte. Abatido pela onda de ódio conservador e primitivo contra os médicos cubanos, o Mais Médicos se liquefez e devolveu à incerteza e à intermitência o atendimento a milhares de brasileiros, sobretudo nas cidades do interior, porque o exercício da Medicina é encarado por essa corja de “doutoras” e “doutores” como Munhoz, Elliakkis et caterva como uma ação entre amigos da mesma classe, do mesmo credo, do mesmo grupo e com o mesmo objetivo.
O vazamento dos dados pessoais da ex-primeira-dama por uma profissional médica do Sírio-Libanês (o hospital também já a demitiu) expôs em definitivo uma faceta sórdida da sociedade brasileira. Estamos, talvez definitivamente, divididos pelas opções e opiniões políticas. Isso é raso. Isso é rasteiro. E isso não é vida real. É ódio e, em alguns casos, é também recalque.
Ricardo Stuckert - 2.fev.2017
FHC e os ex-ministros Celso Amorim (esquerda) e José Gregori (direita)
 prestam solidariedade a Lula.

Nem a foto da visita do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso  a Lula, fazendo-se acompanhar dos ex-ministros José Gregori (Justiça, FHC) e Celso Amorim (Relações Exteriores, Lula), nem o gesto largo de Michel Temer e do presidente do Senado Eunício Oliveira, que visitaram o líder petista ontem à noite para prestar solidariedade na hora de dor e de perda, acompanhados do ex-presidente José Sarney, foi capaz de restaurar a cordialidade como atributo essencial do caráter brasileiro.
A ação dos vermes de jaleco que abusaram da agonia de Marisa Letícia não pode ficar impune no meio médico. Caso fique, toda a corporação corre o risco de começar a ser tratada com o desprezo que bandidos assim merecem. E sentirão a dor da discriminação que se dedica a quem vende a alma a seitas de fanáticos. Médicos como os que se integraram a essa corrente da infâmia nascida no Sírio-Libanês são passíveis do desprezo e merecedores de todos os castigos divinos.

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(*)  Luís Costa Pinto, 48, é jornalista. Graduou-se na UFPE em 1990. Começou no jornalismo em 1988 no Jornal do Commercio do Recife. Trabalhou em redações de “Veja" (1990-96), "O Globo" (1997-98), "Folha de S.Paulo" (1997-98), “Época" (1998-2001) e "Correio Braziliense" (2001-02). Atuou como repórter especial, editor, chefe de sucursal no Recife e em Brasília e editor-executivo. Em 1992 recebeu os prêmios 'Líbero Badaró' e 'Esso de Jornalismo' por reportagens como “Tentáculos de PC”, “Pedro Collor Conta Tudo” e a cobertura do “Caso PC”. Em 1993 recebeu, junto com o jornalista Luciano Suassuna, o prêmio Jabuti de melhor livro-reportagem por “Os Fantasmas da Casa da Dinda” (Ed. Contexto). Desde agosto de 2002 é sócio da Consultoria Idéias, Fatos e Texto, empresa especializada em consultoria de comunicação, análise de cenários e marketing político.

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