terça-feira, 1 de novembro de 2016

Ipanema votou em Crivella

Miguel do Rosário                     
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Não é mais tão linda, nem mais cheia de graça, ao menos para o campo mais progressista. Há tempos que Ipanema, assim como as áreas mais ricas da zona sul do Rio (o extremo sul da zona sul), tem se deslocado para a direita. Mas não deve ter sido fácil para as madames católicas da Vieira Souto optarem pelo mesmo candidato que venceu de maneira esmagadora na zona oeste e nas regiões mais pobres da cidade.
No entanto, para analisar o resultado do segundo turno das eleições no Rio de Janeiro, assim como das eleições em todo país, é preciso se despir de preconceitos.
As zonas ricas da cidade registraram o maior índice de abstenção. Na zona 165, que corresponde ao bairro de Ipanema, o número de abstenções, mais votos nulos e brancos, totalizou 14.568, mais do que a soma de votos em Crivella e Freixo.
Ou seja, quem fala em "desilusão" com a política deve especificar de quem está falando.
Por outro lado, o mapa eleitoral do Rio mostra um nítido corte de classe. Freixo ganhou nos bairros mais ricos, com exceção de alguns mais radicalmente ideológicos à direita, como Ipanema, Barra da Tijuca e Recreio dos Bandeirantes. Esses bairros têm votado, nas últimas eleições presidenciais, no PSDB, de maneira esmagadora.
A partir sobretudo de 2006, o eleitorado do PT migrou para as periferias e bairros pobres, mas com presença importante ainda nos bairros nobres mais ideológicos à esquerda, como Lapa, Catete, Flamengo, algumas áreas de Copacabana, Laranjeiras.
Entretanto, a inexplicável ausência do PT e de seus governos no campo da comunicação política criou um processo que já deveria ter sido detectado pelos analistas. A migração do voto petista do centro na direção das periferias não era um fenômeno de consolidação de um voto ideológico à esquerda nessas regiões, e sim um sinal de fim de ciclo. O fenômeno da pedra no lago serve aqui como ótima metáfora.
A pedra caiu no centro do lago. Era o voto petista ideológico no centro das cidades. Quando as ondas vão se afastando do centro, não o fazem para se fixarem nas periferias, mas como um movimento na direção para fora do círculo. É o fim da onda.
Não é possível responsabilizar apenas a mídia e a direita pelo fenômeno, porque isso é óbvio demais. É claro que a culpa da tomada de Troia se deve ao assédio dos gregos. No entanto, é preciso fazer a autocrítica: não fosse a estupidez de levar aquele bizarro presente grego, um gigantesco cavalo de madeira, para dentro da cidadela, não haveria a derrota.

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