terça-feira, 14 de agosto de 2018


Mesmo sem Lula, PT
vai ao 2º turno contra Bolsonaro


Enquanto a direita está fragmentada e Geraldo Alckmin (PSDB) não esboça “vitalidade” para desbancar Jair Bolsonaro (PFL) da vice-liderança nas pesquisas de opinião, o eleitorado mais à esquerda está “fundamentalmente” unido em torno do PT, graças às estratégias de Lula. Com o ex-presidente na cabeça da chapa petista, o partido venceria no primeiro turno. Mas, mesmo com um substituto, deve chegar ao segundo turno com favoritismo e disputar a estadia por 4 anos no Palácio da Alvorada com Bolsonaro. A avaliação que destoa das previsões sobre um embate entre PT e PSDB pela quarta vez consecutiva é do sociólogo e presidente do instituto Vox Populi, Marcos Coimbra.

Na tarde desta segunda (13), Coimbra atendeu a equipe do GGN para uma entrevista por telefone. Na oportunidade, Coimbra avaliou que Alckmin tenha mais alianças partidárias, maior tempo de rádio e TV, mais recursos para financiar sua campanha e uma certa blindagem da grande mídia, os contras ainda são maiores do que os prós: nada disso deverá fazer grande diferença se o candidato do PSDB é bem conhecido da população e muito mal avaliado. “Televisão faz muita diferença quando os candidatos são pouco conhecidos e bem avaliados.”
Se mídia fosse fator determinante, acrescentou Coimbra, Bolsonaro não estaria bem colocado nas pesquisas. O mesmo raciocínio serve para Lula, condenado e preso pela Lava Jato. "O Bolsonaro não precisou de nenhuma mídia desse tipo para chegar onde chegou. Assim como a candidatura do PT também não precisou, digamos assim, da mídia favorável em momento algum", disse. "A população vem fazendo suas escolhas ignorando o que a grande mídia tem a dizer sobre a eleição e os candidatos, e é por isso que estamos neste ponto. Ambos os candidatos são sistematicamente criticados", acrescentou.
Coimbra também questiona a estratégia eleitoral do PSDB, que penetra cada vez mais na agenda de extrema-direita, na tentativa de tirar votos de Bolsonaro. Na visão do cientista político, quanto mais Alckmin “vai para a direita, mais ele se afasta do eleitorado social-democrata que, no passado, foi muito importante para o PSDB. Quanto mais ele tenta ocupar o espaço de Bolsonaro, mais ele deixa órfão o eleitorado social-democrata que, digamos, não é petista, mas também não é de ultra-direita.”
Como tudo caminha para que o candidato do PT seja Fernando Haddad, Coimbra aposta que as próximas pesquisas eleitorais apresentarão com mais clareza os resultados sobre o potencial de transferência de votos de Lula. Para ele, aliás, a melhor maneira de aferir isso é quando o instituto de pesquisa deixa claro que o ex-prefeito é o escolhido de Lula. O Instituto Ipespe, a pedido da XP Investimentos, vem fazendo uma série de pesquisas adicionando essa informação ao eleitor. No estudo divulgado na semana passada, Lula empurrava Haddad do sétimo para segundo lugar.
Coimbra ainda comentou ao GGN a candidatura de Marina Silva pela Rede, que em sua visão tende a ter um desempenho pior do que em 2014, quando chegou em terceiro lugar com 21% dos votos válidos. Já Ciro Gomes, pelo PDT, deverá ver frustrada sua estratégia de herdar os votos de um PT sem Lula.
Leia, abaixo, a entrevista completa...
GGN: O senhor prevê, em artigo na CartaCapital, um segundo turno entre PT, independente de quem seja o candidato, e Bolsonaro...
Marcos Coimbra: Tem exatamente um ano que escrevi sobre esse assunto, em agosto de 2017, e conclui da mesma maneira que hoje: com Lula, PT tinha candidatura para ganhar no primeiro turno, mas, mesmo sem ele, é favorito para disputar segundo turno contra um adversário de direita. E este adversário seria Bolsonaro. Há 1 ano eu o considerava o único candidato de direita com vitalidade para chegar ao segundo turno. De um ano para cá, muita pouca coisa mudou. Não creio que seja um resultado surpreendente. É o resultado mais previsível, na minha opinião, há mais de 1 ano.
GGN: Bolsonaro é um candidato sem alianças, com muito pouco tempo de TV e recursos, enquanto Geraldo Alckmin tem a maior coligação ao centro-direita, mais de 5 minutos de TV e muito dinheiro para financiar a campanha. O senhor não acha que, em algum momento, esses elementos vão permitir que Alckmin desbanque Bolsonaro do segundo lugar?
Coimbra: O Bolsonaro não precisou de nenhuma mídia desse tipo para chegar onde chegou. Assim como a candidatura do PT também não precisou, digamos assim, da mídia favorável em momento algum. Os 2 candidatos que lideram as pesquisas com 50% e 60% das intenções de votos [somados] foram sistematicamente ignorados e, cada um a seu modo, hostilizados pela grande imprensa. Não me parece que essa manutenção da desiguladade de tratamento de mídia, que agora vai se acentuar com a participação da chapa de Alckmin com o Centrão, vai mudar muito o quadro.
A população vem fazendo suas escolhas ignorando o que a grande mídia tem a dizer sobre a eleição e os candidatos, e é por isso que estamos neste ponto. Ambos os candidatos são sistematicamente criticados. Eu não tenho nenhuma simpatia por Bolsonaro, mas reconheço que ele também é alvo de tratamento muito desfavorável da grande imprensa.
Televisão faz muita diferença quando os candidatos são pouco conhecidos e bem avaliados. Aí você supõe que quando aumentar o nível de conhecimento, essa boa avaliação vai se ampliar. É exatamente o posto de Alckmin. Ele é bem conhecido e mal avaliado. Não sei como ter uma visibilidade de uma pessoa que as pessoas não gostam [pode ajudar]. Por que ele tem entre 15% a 20% de intenções de voto em São Paulo? Lá as pessoas não o conhecem?! Ele é muito conhecido e, hoje, muito mal avaliado! Não é só responsabilidade dele. O partido dele é hoje muito mal avaliado, tem nível de simpatia que não passa de 2% a 3%, nacionalmente falando. Eu não vejo nenhuma razão para que Alckmin finalmente cresça. Ele é ultra-conhecido e não é bem avaliado. Continuo a achar que o favorito a disputar o segundo turno contra a candidatura do PT é o Bolsonaro.
Por que Bolsonaro está bem arraigado em minha opinião? Porque ele é exatamente o posto de Alckmin. Ele tem nível de conhecimento menor que Alckmin, mas entre quem o conhece, a imagem é melhor do que a do Alckmin. É um sujeito determinado, que tem opiniões e não as esconde. Consegue expressar os sentimentos de um pedaço do eleitorado, coisas que Alckmin perdeu. E quanto mais ele [Alckmin] vai para a direita, mais ele se afasta do eleitorado social-democrata que, no passado, foi muito importante para o PSDB. Quanto mais ele tenta ocupar o espaço de Bolsonaro, mais ele deixa órfão o eleitorado social-democrata que, digamos, não é petista, mas também não é de ultra-direita. No campo da ultra-direita, Bolsonaro é muito mais legítimo que Alckmin ou outros nomes.
GGN: O senhor também diz que o candidato do PT não precisa ser Lula.
Coimbra: Todas as pesquisas indicam isso. Lula tem mais do que intenções de votos suficiente para ganhar no primeiro turno. E, sem ele, as pesquisas mais recentes já mostram Haddad mais a frente do que os outros nomes em discussão. Isso para mim não é surpresa. As pessoas gostariam de votar no Lula, gostam dele, acham que ele foi um ótimo presidente e gostariam de vê-lo disputar. Se não puder, essas pessoas votam no candidato que ele indicar, sim.
GGN: A pesquisa de julho do Vox Populi não analisou nenhum cenário sem Lula como candidato do PT. O senhor saberia dizer se o instituto pretende aferir essa transferência de votos de Lula para o Haddad nas próximas pesquisas, informando que ele provavelmente é o escolhido?
Coimbra: Não temos apenas as pesquisas do Vox Populi. Temos várias outras que já saíram [e que indicam a transferência de votos]. O Datafolha avaliou a transferência de votos do Lula para quem quer que seja o candidato indicado por ele e é da ordem de 30%. Estou dizendo que existem já pesquisas, temos informação, mas não são pesquisas registradas ainda. Aliás, é uma boa pergunta: por que que não há pesquisas registradas? Provavelmente o Ibope anuncie semana que vem dados como estes que estamos falando aqui: uma tendência de polarização entre Bolsonaro e Haddad quando Lula não está na lista. Se Lula estiver, e as pesquisas têm que incluir o nome dele, vai se manter esse favoritismo muito acentuado que ele tem.

GGN: Faz muita diferença nos resultados quando o entrevistador diz ao eleitor que o Haddad é o nome escolhido pelo Lula? Porque não parece ser uma prática entre os grandes institutos.
Coimbra: Faz uma enorme diferença, como fez em 2010, antes de começar o horário eleitoral, antes de haver um pouco mais de equilíbrio na cobertura. (...) A Dilma Rousseff era a candidata que Lula apoiava. Quando você falava isso ao entrevistado, ele pensava melhor. Ele tinha direito de saber disso antes de responder. Não me parece ser nada ilegítimo do ponto de vista de pesquisa. Pelo contrário, isto é o correto. Ao apresentar o nome de Haddad, Jaques Wagner ou outro candidato do PT, sem informar que tem o apoio do Lula, [a pesquisa] não diz nada.
GGN: Eu pergunto porque, na semana passada, o Ipespe, a pedido da XP Investimentos, divulgou pesquisa que mostra que Haddad sai do sétimo para o segundo lugar quando o eleitor é informado de que ele tem o apoio direto de Lula. 
Coimbra: Como você sabe, tem muita pesquisa que não é registrada. Isso que o Ipespe constata é verificado por muitas outras pesquisas.
GGN: E a candidatura do Ciro? Ela dividindo votos com o eleitorado de esquerda ameaça o PT?
Coimbra: Ciro, em determinado momento, fez uma avaliação que ele considerou correta: que o eleitorado petista ia ficar órfão, e ele acha que tinha qualificações de receber esse voto. É um equívoco porque esse eleitorado, em grande parte, tem posição político-partidária. Esse núcleo tem identidade com o PT. Esses 20% do eleitorado simpatizam com o PT. Se a pessoa diz que gosta do PT e vota no PT, ela vai fazer isso muito provavelmente. Acho que isso o Ciro subestimou. Ele achou que teria uma grande massa de eleitores do PT sem saber o que faria da eleição.
GGN: Como vê a candidatura de Marina? Acha que ela pode ter um desempenho pior do que em 2014?
Coimbra: Acho Marina uma pessoa positiva, honesta, com trajetória de vida louvável, muito bonita, mas claramente ela passou do ponto. As pessoas acham que ela se enfraqueceu, que tem pouca motivação, pouca vitalidade, pouca capacidade de enfrentar o desafio de governar o País no momento que vivemos. Ela continua uma pessoa muito respeitada, mas com imagem político-administrativa muito enfraquecida. A decisão de apoiar o PSDB em 2014 fez muito mal a ela junto ao eleitorado progressista. É muito provável [que ela tenha desempenho pior].
De certa forma, eu digo isto no meu artigo. Lula foi de extrema capacidade política unificando o voto de esquerda, e a direita está fragmentada. Das 13 candidaturas, 10 estão disputando o eleitorado do centro para a direita.
GGN: Nesta conta do centro para a direita, o Ciro está incluso?
CoimbraNeste momento, cada vez mais. Quando escolheu  Katia Abreu como vice, ele sinalizou o que consegue fazer agora. Mas é claro que ele é uma pessoa que tem que se respeitar, assim como Marina. São pessoas com trajetória de vida muito respeitadas. Mas que o eleitorado de esquerda fundamentalmente está unificado, está. E quem fez isso foi o Lula.

Nenhum comentário:

Postar um comentário